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minha gata não insista, Disneylândias não vão te levar pro céu

Somos contos contando contos, nada. - Fernando Pessoa 

segunda-feira, julho 07, 2008

02:02 - I'm the ugly lover

I am the ugly lover
You'll find us rolling on the dirty floor
Break my body, hold my bones, hold my bones


- Pixies

Hoje, faz uma semana que Rita morreu. Saiu pra beber com os amigos de infância, o idiota do motorista bebeu demais, jogou o carro em um poste. Por azar do destino, ou por reflexo vital do bêbado, o poste bateu em cheio na parte traseira direita, bem na mosca pra foder de vez a minha vida. Agora eu tô aqui acabada, ouvindo Pixies (sempre me pareceu uma banda extremamente lésbica) e lembrando do cheiro da pele dela, do contato suave dos cachos dela nos meus peitos nus, das noites viradas sem muito sexo, mas com longos e divertidíssimos papos de filosofia de boteco.

A gente até transava, tivemos algumas fases alucinantes, quando não tínhamos obrigações e podíamos nos dedicar inteiramente aos nossos corpos. Na verdade, o grosso que sobrou do relacionamento, foi outra coisa mesmo. Foi algo chamado (forçando na pieguisse) de companheirismo ou amizade.

Na real, nem sei se sou lésbica, dei pra uns carinhas por aí e nunca deixou de ser bom, mas a Rita eu amava, como nunca vou amar outro homem ou mulher. A gente já estava juntas há quase um ano, os amigos já vinham se acostumando. Até as piadinhas a gente levava numa boa... Nós mesmas fazíamos a maior parte das piadinhas.

Ontem, saí com nossa turma. Todo mundo insistindo bastante, aquela coisa de "não pode ficar em casa sem fazer nada" e "tem que tentar se divertir". Tanto eles quanto eu sabem que é pura balela, me divertir está além de qualquer perspectiva. Mas calma, eu sei que isso passa. Desligo a música, quero tentar pensar melhor. Então, estava falando de quando saí ontem a noite... Fomos num lugar novo, música eletrônica, decoração futurista, essa coisa toda. O único lugar onde consegui ficar em paz foi o lounge, mesmo assim uns caras desavisados tentaram chegar, mas meu olhar de desespero parece ter funcionado bem pra afastar todos. Uma hora tentei dançar, mas é ridículo dançar careta no meio de uma roda de gente viajando em ecstasy, enchi o saco, peguei um táxi e vim pra casa.

Tenho uma teoria de que preciso esgotar Rita, botar tudo o que há de Rita em mim para fora, queimar todas essas fotografias guardadas na memória. Só assim serei livre novamente, essa é a única alternativa encontrada para superar isso tudo. Essa carta então não passa de mais uma tentativa nesse sentido, desejo com força esquecer pra sempre de tudo escrito aqui, e é exatamente para isso que escrevo.

Ponho pra tocar "Bull in the Header", a música favorita dela, e vou, de olhos fechados, relembrado cada pequena porção do seu corpo, cada reentrância da sua pele. Mentalmente aperto o "Delete", esse corpo não existe mais, não há razão para mantê-lo aqui, essa lembrança pesada, essa dor passada. Tudo isso já passou, repito para mim mesma, agora é seguir andando. Não tenho certeza se esse bizarro ritual vai dar resultado, mas sempre acreditei em mágica, e acho que pra ela funcionar, basta isso: acreditar.

Agora as caixas de som tocam "Don't you know I get emulsified", Rita sempre me dizia que esse era o hino lésbico do Yo La Tengo, acho a música divertida, bonitinha, animada, etc. Meu próximo passo é apagar as Mp3 e jogar fora os CDs que tem relação com Rita. Estou pensando em jogar tudo fora de uma vez, esse vai ser o jeito... Ficar em silêncio por um tempo, quem sabe isso também não vai me ajudar, o silêncio tem semelhanças com a boa música.

Será uma boa idéia escrever um livro sobre Rita? Não algo biográfico como isso que escrevo agora com os olhos cheios de lágrimas, mas uma ficção, posso transformá-la em uma heroína e assim exorcizar os últimos traços de sua personalidade ainda presentes em mim. Lembro, na época da publicação do meu primeiro livro, quando me perguntaram se eu me sentia feliz com o "feito" (dada a imensa dificuldade no mercado editorial do país, etc), respondi algo do tipo "como se diz, todo mundo na vida tem que ter um filho, plantar uma árvore e escrever um livro, me consola o fato do meu livro ser mais bonito que a maioria dos filhos da maioria das pessoas". Lembro claramente a idéia repugnante da maternidade, podia jurar de pé juntos que nunca iria ter um filho; no entanto, aqui estou eu agora desejando ter um filho da Rita.

Deleto essa imagem, rápido, coisa horrível, um filho de duas mães, concepção impossível, agressão a genialidade da natureza. Quem sabe no futuro isso seja comum, uma pena que mães lésbicas só possam ter filhos fêmeas... Não, não me parece plausível a invenção de tal anomalia, é como assinar o atestado de óbito do sexo masculino, esse gênero tão pouco útil.

Mais uma vez de olhos fechados, lembro dos olhos dela, dos sulcos, das raras rugas, das olheiras que nunca desapareciam. Apago. Faço força pra me recordar dos cabelos, já estão quase esquecidos, mas é perigoso deixar algo assim, por sí só, então trago a memória de volta e com força acabo com ela de uma vez por todas. E assim sigo meu esforço ritualístico, passando por suas coxas, suas unhas, sua língua, seus dentes e obturações. Deleto com veemência e sem mágoa. Continuo pelas costas, as tetas, os mamilos, a boceta, o pé. O pé foi a parte mais difícil, depois dele as coisas fluíram melhor.

(...)

Já me sinto mais distante de Rita, parece ter partido em uma longa viagem de navio, restaram poucas coisas. Até minha respiração está mais leve e meus olhos menos marejados. Tudo parece aceitável, é só não pensar fundo o suficiente.

Faço um esforço além, apago da mente o nome dela, apago seu gênero, transformo o resto (inclusive a absurda idéia do livro ficcional) em uma coisinha de nada, como a memória do passarinho que tive quando tinha seis anos e fugiu. Agora estou pronta, ponho pra tocar "Fake Plastic Trees", adoro esse som, lembra meu irmão. A garrafa de vinho secou, me resta na boca um gosto estranho, meio amargo, quase não dá pra associar com o que bebi.

Amanhã vou trabalhar de novo, a Dani vai estar lá, linda como sempre, tão atenciosa, sua gentileza é quase uma carícia. Quem sabe?

pedro s.

Pedro S. S. 2005 > 2009 Creative Commons License
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