Preâmbulo às instruções para dar corda ao Relógio.
Pensa nisto: quando te oferecem um relógio, oferecem-te um pequeno inferno florido, uma prisão de rosas, um calabouço de ar. Não te dão somente o relógio, muitos parabéns, que te dure muitos e bons, é uma óptima marca, suíço com não sei quantos rubis, não te oferecem somente esse pequeno pedreiro que prenderás ao pulso e passeará contigo. Oferecem-te -- ignoram-no, é terrível ignorá-lo -- um novo bocado frágil e precário de ti mesmo, algo que é teu mas não é o teu corpo, que tens de prender ao teu corpo com uma correia, como um bracito desesperado pendente do pulso. Oferecem-te a necessidade de lhe dar corda todos os dias, a obrigação de dar corda para que continue a ser um relógio; oferecem-te a obsessão de ver as horas certas nas montras das joalharias, o sinal horário na rádio, o serviço telefónico. Oferecem-te o medo de o perder, de seres roubado, de que caia ao chão e se parta. Oferecem-te uma marca, a convicção de que é uma marca superior às outras, oferecem-te a tentação de comparares o teu com os outros relógios. Não te oferecem um relógio, és tu o oferecido, a ti oferecem para o nascimento do relógio.
Instruções para dar corda ao Relógio
Lá no fundo está a morte, mas não tenha medo.
Segure o relógio com uma mão, pegue com dois dedos o pino da corda, puxe-o suavemente.
Agora se abre um outro prazo, as árvores soltam suas folhas, os barcos correm regata.
Como um leque, o tempo vai se enchendo de si mesmo e dele brotam o ar, as brisas da terra, o perfume do pão, a sombra de uma mulher.
Que mais você quer?... Que mais você quer??!
Amarre o relógio depressa a seu pulso, deixe-o bater em liberdade.
O medo enferruja as âncoras, cada coisa que pôde ser alcançada e foi esquecida começa a corroer as veias do relógio, gangrenando o sangue frio de seus pequenos rubis.
E lá no fundo está a morte, se não corremos e chegamos antes e compreendemos que já não tem a menor importância!
Lá no fundo está a morte, mas não tenha medo.
Segure o relógio com uma mão, pegue com dois dedos o pino da corda, puxe-o suavemente.
Agora se abre um outro prazo, as árvores soltam suas folhas, os barcos correm regata.
Como um leque, o tempo vai se enchendo de si mesmo e dele brotam o ar, as brisas da terra, o perfume do pão, a sombra de uma mulher.
Que mais você quer?... Que mais você quer??!
Amarre o relógio depressa a seu pulso, deixe-o bater em liberdade.
O medo enferruja as âncoras, cada coisa que pôde ser alcançada e foi esquecida começa a corroer as veias do relógio, gangrenando o sangue frio de seus pequenos rubis.
E lá no fundo está a morte, se não corremos e chegamos antes e compreendemos que já não tem a menor importância!
pedro s.